quinta-feira, 1 de abril de 2010

É antijurídica a cobrança de ICMS em atividades que não impliquem transferência de titularidade do bem

Há muito que a doutrina tributária mais especializada no tema (Roque Antônio Carrazza, p.ex.) vem sustentando de forma fundamentada que o ICMS não incide sobre qualquer circulação de bens; mas, tão somente, naquela circulação de bens ("mercadorias") decorrente de uma operação mercantil (circulação decorrente de um negócio jurídico). Assim, estariam afastadas da hipótese de incidência do tributo estadual, por exemplo: a) operações de "leasing" em que o bem não teve - ao final do negócio - sua titularidade transferida ao arrendatário; b) mera remessa de mercadoria de um estabelecimento comercial para outro do mesmo titular; c) mera retirada de mercadorias de um estabelecimento para outro por força de enchentes, reformas... Em tais casos, saliente-se, não houve um negócio jurídico (compra-e-venda, p. ex.) que precedesse a circulação (não-econômica, portanto) do bem ("mercadoria"), não havendo, por conseguinte, de se cogitar a incidência de ICMS. Transcrevo, corroborando com o entendimento acima, a seguinte notícia colhida do portal Universo Jurídico:
É ilegal a cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em operações de arrendamento mercantil (leasing) na qual não foi efetivada a transferência da titularidade do bem, quer o bem arrendado provenha do exterior, quer não.
A conclusão acima é da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar, em regime de repetitivo, recursos especiais da Fazenda Pública de São Paulo e da TAM Linhas Aéreas S/A.
Em mandado de segurança preventivo, impetrado em 6/10/2002, a TAM protestou contra suposto ato ilegal e abusivo praticado pelo chefe de posto fiscal da Secretaria da Fazenda de São Paulo, do Aeroporto Internacional de Guarulhos. O ato teria consistido na exigência de ICMS sobre a importação de aeronave pelo regime de arrendamento simples (leasing operacional), sem opção de compra e sem cobertura cambial.
Uma liminar foi deferida. Posteriormente, no entanto, ela foi revogada, e a sentença julgou improcedente o pedido da TAM. “No caso dos autos, a operação realizada pela impetrante apenas tenta burlar o interesse fiscal do Estado, posto que, na verdade, não estávamos diante de contrato de leasing, mas, sim, de uma compra e venda, financiada no decorrer do tempo", afirmou o magistrado.
A TAM apelou e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu parcial provimento ao recurso. “A base de cálculo do tributo deve ser a expressão econômica desse negócio jurídico, ou seja, aquela retratada nas demais parcelas de pagamento do arrendamento”, afirmou o desembargador. A Fazenda opôs embargos de declaração, mas foram rejeitados.
No recurso especial, a Fazenda sustentou, preliminarmente, que a decisão do TJSP incorreu em vício de julgamento ultra petita (conceder mais que o pedido), ao determinar que a base de cálculo seja a expressão econômica retratada nas parcelas de pagamento do arrendamento mercantil. Segundo o órgão, a TAM pediu, na inicial, apenas provimento jurisdicional que a autorizasse importar a aeronave, adquirida no exterior sob o regime de arrendamento mercantil, sem que lhe fosse exigido o recolhimento do ICMS.
No mérito, apontou violação aos artigos 13 (inciso V e parágrafo 1º) e 14, ambos da Lei Complementar 87/96. “Inexiste fundamento legal que autorize fixar as parcelas de pagamento do arrendamento mercantil com base de cálculo do ICMS incidente na importação em exame", afirmou a Fazenda.
Em recurso adesivo, a TAM alegou que a decisão ofendeu o artigo 3º, VIII, da lei Complementar 87/96. “Este dispositivo prevê a não incidência do ICMS sobre operações de arrendamento mercantil (não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário)”, afirmou.
A Primeira Turma deu provimento ao recurso especial adesivo da TAM. “A incidência do ICMS, mesmo no caso de importação, pressupõe operação de circulação de mercadoria (transferência da titularidade do bem), o que não ocorre nas hipóteses de arrendamento em que há mera promessa de transferência pura do domínio desse bem do arrendante para o arrendatário”, afirmou o ministro Luz Fux, relator do caso.
O recurso especial da Fazenda foi julgado prejudicado, pois as alegações se restringiam à base de cálculo do ICMS, determinada pelo juiz. Como foi provido o da TAM, para afastar a incidência do ICMS, o da Fazenda perdeu o objeto do pedido.
Por se tratar de recurso representativo da controvérsia, sujeito ao procedimento do artigo 543-C do CPC, o ministro determinou, após a publicação do acórdão, a comunicação à Presidência do STJ, aos ministros da Primeira Seção e aos tribunais de Justiça dos estados.
Fonte: STJ
No mesmo sentido e, em situação parecida, tem-se:
Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário. O acórdão recorrido entendeu pela não incidência do ICMS sobre a movimentação física de bens entre estabelecimentos da mesma empresa, por não configurar uma operação de circulação.No RE, fundando no art. 102, III, a, da Constituição, alegou-se, em suma, ofensa ao art. 155, § 2º, VII, da mesma Carta.O agravo não merece acolhida. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a jurisprudência da Corte que é no sentido de que a mera saída física do bem, sem que ocorra a transferência efetiva de sua titularidade, não configura operação de circulação sujeita a incidência do ICMS, a exemplo do que se observa do julgamento do AI 131.941-AgR/SP, Rel. Min. Março Aurélio, cuja transcrevo a seguir:"IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS - DESLOCAMENTO DE COISAS - INCIDÊNCIA - ARTIGO 23, INCISO II DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ANTERIOR. O simples deslocamento de coisas de um estabelecimento para outro, sem transferência de propriedade, não gera direito à cobrança de ICM. O emprego da expressão "operações", bem como a designação do imposto, no que consagrado o vocábulo "mercadoria", são conducentes à premissa de que deve haver o envolvimento de ato mercantil e este não ocorre quando o produtor simplesmente movimenta frangos, de um estabelecimento a outro, para simples pesagem."No mesmo sentido, menciono as seguintes decisões, entre outras: RE 267.599/MG, Rel. Min. Ellen Gracie; RE 220.003/SP, Rel. Min. Cezar Peluso; AI 481.584-AgR/MG. Rel. Min. Cármen Lúcia; AI 693.714-AgR/RS, de minha relatoria; RE 158.834/SP, Rel. para o acórdão Min. Março Aurélio, AI 271.528-AgR/PA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, RE 113.090/PB, Rel. Min. Djaci Falcão, RE 93.523/AM, Rel. Min. Cordeiro Guerra.Isso posto, nego seguimento ao recurso.Publique-se.Brasília, 4 de fevereiro de 2010.Ministro RICARDO LEWANDOWSKI- Relator.

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