quinta-feira, 3 de junho de 2010

Prof. Hugo de Brito Machado escreve sobre roubo à carga e a incidência de IPI

Interessante enfoque que o prof. Hugo de Brito Machado dá à questão de inicidir ou  não IPI quando uma carga é roubada. A matéria foi escrita na Coluna Opinião do Jornal o Povo de ontem, abordando, inclusive,  que a tributação deve guardar correlação com o retorno estatal para o cidadão contribuinte. Afora o fato de que a "saída" de produtos industrializados não se restringir à mera saída física do estabelecimento produtor, mas sim, uma operação econômica, o texto enfoca a questão de o cidadão ser "penalizado" duas vezes pelo Estado - roubo da carga por deficiência na prestação de um serviço público essencial (segurança) e a elevada alíquota incidente sobre o "produto" furtado. Vamos ao artigo:

Carga roubada e IPI
Hugo de Brito Machado
Professor titular de Direito Tributário da UFC e presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários
02/06/2010 00:15
Está em apreciação no Superior Tribunal de Justiça uma importante questão de Direito Tributário, suscitada pela extrema insegurança em que vivemos. Uma fábrica de cigarros, produto sobre o qual o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) corresponde a mais do dobro do preço, tem o seu caminhão de entrega assaltado, e roubada a carga correspondente. A questão que está colocada para julgamento consiste em saber se é devido, ou não, o IPI
Quem sustenta resposta afirmativa argumenta que o fato gerador desse imposto é a saída da mercadoria e que no momento do roubo esse fato já estava consumado. Ocorre que a palavra saída não pode ser entendida em seu sentido simplesmente literal, como saída física do produto. Saída, no caso, deve ser entendia como operação, no sentido econômico, em virtude da qual o produto tem sua propriedade transferida do fabricante para o comerciante que o adquire, o revendedor. E essa operação no caso em tela não se completou porque o produto não chegou a ser entregue a seu comprador.
Por outro lado, não se pode desconsiderar que o tributo é pago exatamente como forma pela qual os cidadãos custeiam a atividade do Estado, que tem o dever de garantir os seus direitos fundamentais, entre os quais se destacam os direitos à segurança e à propriedade, como preceitua expressamente o art. 5º da vigente Constituição Federal, direitos que no caso em referência foram violados exatamente em face da insuficiência do aparelho estatal destinado a garantir tais direitos.
Os ladrões de carga geralmente são pessoas que deveriam estar presos. Verdadeiros profissionais do crime que estão soltos graças à negligência do Estado no trato das questões relativas à segurança pública em nosso País. Assim, a rigor o Estado é responsável e desta forma tem o dever de indenizar o particular pelos danos decorrentes de sua omissão. Constitui, portanto, verdadeiro absurdo admitir-se que além de não indenizar os prejuízos decorrentes de sua omissão ainda pretenda cobrar o imposto sobre a operação que, graças a ela, não se consumou.
Seja como for, certo é que do ponto de vista estritamente jurídico, no caso de roubo de carga, quando o vendedor do produto ainda o transportava para entregá-lo ao comprador, não se pode considerar consumado o fato gerador do tributo. Esse fato gerador, diz o Código Tributário Nacional, é a saída do produto do estabelecimento industrial, mas a palavra saída há de ser entendida como entrega ao comprador, pois é isto que em geral acontece. Quando a saída física ocorre antes da entrega, só com esta estará consumado o fato gerador da obrigação tributária. Assim, no caso de roubo de carga antes da entrega ao comprador, o fato gerador do imposto evidentemente não se completa.

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