sexta-feira, 9 de julho de 2010

Ainda tem município que cobra ISS sobre locação de bens móveis...

Faz tempo que nossos tribunais pátrios uniformizaram o entendimento segundo o qual é inconstitucional a tributação pelo ISS (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), por parte dos municípios brasileiros, das atividades de locação de bens móveis. Os julgados que concluíram pela não-incidência de ISS em tais prestações foram todos fundamentados no conceito constitucional de "serviços", que se restringiria a "obrigações de fazer", não alcançando obrigações de "dar" ou de "entregar", não podendo o legislador infraconstitucional alterar os institutos e conceitos próprios do direito privado (Teoria das Obrigações - Dir. Civil) para criar obrigação tributária a seu favor, consoante prescreve o art. 110/CTN.
Vejamos que a Lei Complementar n.º 116, de 31.07.2003 (normas gerais acerca do ISS, cogentes aos municípios brasileiros) sequer contém previsão normativa no sentido de "autorizar" a tributar de locação de bens móveis - tributa-se, por disposição expressa no diploma complementar (sub-itens constantes no Item 3 da Lista de Serviços Anexa à LC116/2003), os "serviços prestados mediante locação"(atividades-meio) - algo bem diferente da locação simples (atividade-fim).
Recordo que o projeto que deu origem à Lei Complementar 116/03 continha previsão (na lista de serviços anexa ao diploma embrionário) no sentido de tributar a locação pura; porém, o  Executivo Federal vetou tal dispositivo, consoante as  razões do veto abaixo colacionadas (disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/Mensagem_Veto/2003/Mv362-03.htm):
Itens 3.01 e 13.01 da Lista de serviços
"3.01 – Locação de bens móveis."
"13.01 – Produção, gravação, edição, legendagem e distribuição de filmes, video-tapes, discos, fitas cassete, compact disc, digital video disc e congêneres."

Razões do veto
"Verifica-se que alguns itens da relação de serviços sujeitos à incidência do imposto merecem reparo, tendo em vista decisões recentes do Supremo Tribunal Federal. São eles:
O STF concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto por empresa de locação de guindastes, em que se discutia a constitucionalidade da cobrança do ISS sobre a locação de bens móveis, decidindo que a expressão "locação de bens móveis" constante do item 79 da lista de serviços a que se refere o Decreto-Lei no 406, de 31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei Complementar no 56, de 15 de dezembro de 1987, é inconstitucional (noticiado no Informativo do STF no 207). O Recurso Extraordinário 116.121/SP, votado unanimemente pelo Tribunal Pleno, em 11 de outubro de 2000, contém linha interpretativa no mesmo sentido, pois a "terminologia constitucional do imposto sobre serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo a contrato de locação de bem móvel. Em direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprios, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável." Em assim sendo, o item 3.01 da Lista de serviços anexa ao projeto de lei complementar ora analisado, fica prejudicado, pois veicula indevida (porque inconstitucional) incidência do imposto sob locação de bens móveis.
O item 13.01 da mesma Lista de serviços mencionada no item anterior coloca no campo de incidência do imposto gravação e distribuição de filmes. Ocorre que o STF, no julgamento dos RREE 179.560-SP, 194.705-SP e 196.856-SP, cujo relator foi o Ministro Ilmar Galvão, decidiu que é legítima a incidência do ICMS sobre comercialização de filmes para videocassete, porquanto, nessa hipótese, a operação se qualifica como de circulação de mercadoria. Como conseqüência dessa decisão foram reformados acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que consideraram a operação de gravação de videoteipes como sujeita tão-somente ao ISS. Deve-se esclarecer que, na espécie, tratava-se de empresas que se dedicam à comercialização de fitas por elas próprias gravadas, com a finalidade de entrega ao comércio em geral, operação que se distingue da hipótese de prestação individualizada do serviço de gravação de filmes com o fornecimento de mercadorias, isto é, quando feita por solicitação de outrem ou por encomenda, prevalecendo, nesse caso a incidência do ISS (retirado do Informativo do STF no 144).
Assim, pelas razões expostas, entendemos indevida a inclusão destes itens na Lista de serviços."
Assim, resta indiscutível que em se tratando de locação simples, pura, não incide ISS, não devendo serem objeto de retenção na fonte tais valores - em face da reconhecida inconstitucionalidade na cobrança, inclusive, por parte do legislador nacional.
Mas, no entanto, há quem insista na cobrança (movido pelo viés eminentemente arrecadatório), em desrespeito às decisões do STF e à própria lei complementar nacional. Vejamos a seguinte notícia extraída do Portal do Supremo Tribunal Federal:

Quinta-feira, 08 de julho de 2010
Retenção de ISS sobre aluguel de veículos no Rio de Janeiro é contestada no Supremo
A Empresa Brasileira de Engenharia e Comércio S.A recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a retenção do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) realizada em 30 contratos de locação de veículos, sem motorista, firmados com a Prefeitura do Rio de Janeiro.
Na Reclamação (RCL 10293) ajuizada no STF, a empresa pede a concessão de liminar para que seja ordenado à Prefeitura e às Secretarias municipais da Fazenda e da Ordem Pública que se abstenham de reter qualquer valor relativo ao imposto sobre os contratos de locação.
Na ação, a empresa argumenta que já tentou por vias administrativas, sem sucesso, evitar a retenção do imposto. Sustenta que a Prefeitura do Rio está descumprindo o enunciado da Súmula Vinculante 31, do STF, segundo a qual “é inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”.
Segundo a ação, a Prefeitura está fazendo uma compensação indevida quando, ao efetuar o pagamento das faturas mensais sobre os contratos de aluguel de veículos, retém o percentual de 5% do valor a título de ISS.
A empresa reclama que a retenção do imposto está causando grandes prejuízos, configurando o perigo de demora da decisão judicial (periculum in mora), um dos requisitos necessários para a concessão da liminar. No mérito, a empresa pede que a reclamação seja julgada procedente para anular todas as retenções do imposto feitas sobre os contratos.
A ação está sob análise do ministro Carlos Ayres Britto.
AR/CG//RR

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