sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Imunidade Tributária - Informativo (STF) jurisprudência recente

PLENÁRIO (STF)

CODESP e Imunidade - 3
Em conclusão, o Tribunal, por maioria, deu parcial provimento a recurso extraordinário interposto pela Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP contra acórdão do extinto Tribunal de Alçada Civil do referido Estado que entendera serem devidos, pela recorrente, o IPTU e as taxas de conservação e limpeza de logradouro público, remoção de lixo e iluminação pública sobre imóveis que compõem o acervo do Porto de Santos — v. Informativos 405 e 441. Inicialmente, não se conheceu do recurso relativamente aos artigos 21, XII, f e 22, X, da CF, por falta de prequestionamento, nem no tocante às taxas, haja vista não se ter apontado o dispositivo constitucional que teria sido inobservado pelo Tribunal a quo, no que estabelecida a legalidade da exigência do tributo desde que os serviços sejam postos à disposição do contribuinte, ainda que não utilizados. No mérito, prevaleceu o voto do Min. Joaquim Barbosa que reputou necessária, para a aplicabilidade da imunidade recíproca à CODESP, a superação dos seguintes estágios: 1) a imunidade seria subjetiva, ou seja, se aplicaria à propriedade, bens e serviços utilizados na satisfação dos objetivos institucionais imanentes do ente federado, cuja tributação poderia colocar em risco a respectiva autonomia política. Em conseqüência, seria incorreto ler a cláusula de imunização de modo a reduzi-la a mero instrumento destinado a dar ao ente federado condições de contratar em circunstâncias mais vantajosas, independentemente do contexto; 2) atividades de exploração econômica, destinadas primordialmente a aumentar o patrimônio do Estado ou de particulares, deveriam ser submetidas à tributação, por apresentarem-se como manifestações de riqueza e deixarem a salvo a autonomia política; 3) a desoneração não deveria ter como efeito colateral relevante a quebra dos princípios da livre concorrência e do exercício de atividade profissional ou econômica lícita.

CODESP e Imunidade - 4
O Min. Joaquim Barbosa constatou que a recorrente passaria nesses estágios e que o acórdão recorrido teria se equivocado quanto à caracterização da atividade desempenhada por ela. No ponto, citou uma série de precedentes da Corte no sentido de que a exploração dos portos marítimos, fluviais e lacustres caracteriza-se como serviço público. Considerou, em seguida, que confirmariam a lesão à livre iniciativa, livre concorrência e ao dever fundamental de pagar tributos três quadros hipotéticos. Disse que, se a participação privada no quadro societário da CODESP fosse relevante, o intuito lucrativo sobrepor-se-ia à exploração portuária como instrumentalidade do Estado, o que não seria o caso dos autos, já que a União deteria 99,97% das ações da empresa. Destarte, mantida a relevância da instrumentalidade estatal, não se vislumbraria violação do dever fundamental de pagar tributos e de custeio dos demais entes federados. Aduziu que, por outro lado, os autos não indicariam que a CODESP operaria com intuito primordial de auferir vantagem econômica para simples aumento patrimonial da União. Destacou que, se a CODESP operasse em mercado de livre acesso, o reconhecimento da imunidade violaria os postulados da livre concorrência e da livre iniciativa, mas que isso também não se daria na espécie, haja vista inexistir indicação de que a CODESP tivesse concorrentes em sua área de atuação específica. Reputou, ainda, importante examinar se a propriedade imóvel em questão seria utilizada diretamente pela entidade imune em sua atividade-fim, ou se seria cedida a entidade privada que se destinaria a explorá-la com intuito lucrativo. Observou que a recorrente seria uma instrumentalidade da União, isto é, entidade derivada, criada com a finalidade de executar um mister que a Constituição atribuiu à União. Por fim, asseverou caber à autoridade fiscal indicar com precisão se a destinação concreta dada ao imóvel atenderia, ou não, ao interesse público primário ou à geração de receita de interesse particular ou privado. Assim, reconheceu a imunidade do imóvel pertencente à União, mas afetado à CODESP, utilizado em suas atividades-fim. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso, Presidente, que desproviam o recurso. Precedentes citados: RE 172816/RJ (DJU de 13.5.94); RE 356711/PR (DJU de 7.4.2006); RE 253394/SP (DJU de 11.4.2003); RE 265749/SP (DJU de 12.9.2003).
RE 253472/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, 25.8.2010. (RE-253472)
 
IPTU: Imunidade Tributária Recíproca e Cessão de Uso de Bem Público - 1
O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de cedente de imóvel público objeto de contrato de cessão de uso para exploração de atividade econômica estar sujeito, ou não, à tributação pelo imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU. Trata-se, na espécie, de recurso extraordinário interposto pelo Município do Rio de Janeiro contra acórdão do tribunal de justiça local que entendera, consoante o disposto no art. 150, VI, a, da CF (“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;”), ser indevida a cobrança da aludida exação relativamente à empresa detentora da concessão de uso de imóvel situado em aeroporto de propriedade da União. Alega a recorrente violação ao art. 150, VI, a, e § 3º, da CF (“§ 3º - As vedações do inciso VI, ‘a’, e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.”), ao argumento de que a imunidade concedida aos entes federados não poderia beneficiar a exploração privada de atividades econômicas, pois tal hipótese seria expressamente excepcionada do campo da imunidade tributária recíproca. O Min. Joaquim Barbosa, relator, proveu o recurso. Inicialmente, rejeitou a preliminar de não conhecimento suscitada da tribuna, no sentido da incidência do Enunciado 283 da Súmula do STF (“É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.”), uma vez que o acórdão recorrido teria por base legislação infraconstitucional e o ora recorrente não interpusera recurso especial. Asseverou que o mencionado acórdão adotara como fundamento tanto a aplicabilidade da imunidade tributária à propriedade imóvel em questão como a impossibilidade de a recorrida ser tida como sujeito passivo.
RE 434251/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 26.8.2010. (RE-434251)
 
IPTU: Imunidade Tributária Recíproca e Cessão de Uso de Bem Público - 2
Em seguida, o relator aduziu que o reconhecimento da imunidade tributária recíproca dependeria de aprovação nos estágios aludidos no julgamento do RE 253472/SP, acima relatado. Tendo em conta que a atividade exercida pela recorrida seria alheia à administração aeroportuária — já que exploraria “ramo do comércio de importação e exportação de automóveis, caminhões, motores e quaisquer espécies de veículos automotores, inclusive peças, acessórios, oficina mecânica, reparos, pintura de quaisquer veículos e outras atividades correlatas ao ramo automobilístico” —, entendeu que a pretensão de imunidade falharia nos estágios referidos. Assim, a desoneração concedida teria como efeito colateral garantir vantagem competitiva artificial, na medida em que a retirada de um custo permitiria o aumento do lucro ou a formação de preços menores, desequilibrando as relações de mercado. O relator consignou que seria o momento de revisão da jurisprudência da Corte, a fim de que fosse assentada a inaplicabilidade da imunidade tributária recíproca à propriedade imóvel desvinculada de finalidade estatal.
RE 434251/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 26.8.2010. (RE-434251)
 
IPTU: Imunidade Tributária Recíproca e Cessão de Uso de Bem Público - 3
No tocante à questão de a recorrida não poder ser considerada sujeito passivo da exação, visto que incabível sua qualificação como “possuidora a qualquer título”, o relator superou orientação consolidada pela 2ª Turma para concluir que a matéria poderia ser objeto de apreciação em recurso extraordinário e afastou, em conseqüência, a aplicação dos Verbetes 279 e 283 da Súmula do STF. Afirmou que a definição do sujeito passivo do IPTU dependeria de interpretação constitucional, pois seria com fundamento na competência tributária que o ente federado cobraria validamente o tributo. Destarte, salientou que o art. 34 do CTN (“Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.”) deveria ser lido à luz da Constituição, com ênfase em 3 pontos: materialidade possível do IPTU, isonomia e livres iniciativa e concorrência. Mencionou que a sujeição passiva também abarcaria a figura do responsável tributário, não podendo o tribunal de origem pura e simplesmente julgar ser a tributação inválida, porquanto direcionada a quem não seria proprietário. Assinalou a existência de termo de responsabilidade — em que firmada a responsabilidade do concessionário pelo pagamento de tributos municipais — a compor o conjunto fático-probatório, o que tornaria desnecessária a reabertura de instrução para se decidir esse caso. Em arremate, destacou que o locatário empresarial com fins lucrativos também seria possuidor a qualquer título, para fins de incidência do IPTU, nos termos constitucionais. Resgatou, no ponto, a essência da Súmula 456 desta Corte (“O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie.”) para adequar o julgado às linhas essenciais que dariam sentido tanto à imunidade tributária como à atribuição de sujeição passiva.
RE 434251/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 26.8.2010. (RE-434251)
IPTU: Imunidade Tributária Recíproca e Cessão de Uso de Bem Público - 4
Em divergência, o Min. Dias Toffoli desproveu o recurso e manteve a orientação firmada no julgamento do RE 451152/RJ (DJU de 27.4.2007), segundo a qual o cerne da controvérsia não estaria em saber se haveria, ou não, imunidade recíproca quando o imóvel da União fosse destinado à exploração comercial, mas se a recorrida poderia, ou não, figurar no pólo passivo da obrigação tributária do IPTU. Na ocasião, entendera-se que a empresa não preencheria nenhum dos requisitos para ser contribuinte do imposto, pois detentora de posse precária e desdobrada, decorrente de contrato de concessão de uso. Após, pediu vista a Min. Cármen Lúcia. RE 434251/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 26.8.2010. (RE-434251)

REPERCUSSÃO GERAL 

Imunidade Tributária Recíproca: Sociedade de Economia Mista e Serviços de Saúde - 1
O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a aplicação, ou não, da imunidade recíproca (CF, art. 150, VI, a) a sociedade de economia mista que atua na área de prestação de serviços de saúde. O Min. Joaquim Barbosa, relator, negou provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelos Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. O relator citou, inicialmente, aspectos principais que deveriam ser observados no campo da imunidade tributária recíproca. Disse que a atividade protegida deveria estar vinculada às atividades essenciais da entidade que haveria de atender diretamente a interesse público primário e essencial. Para ele, a exploração de atividades econômicas, ainda que sob regime de monopólio, não ensejaria a incidência da proteção constitucional, pois a função da imunidade tributária recíproca não seria conceder vantagem de custo ao Estado na contratação de serviços e na aquisição de mercadorias, em detrimento do poder de tributar de outro ente federado. A aplicação da imunidade não deveria favorecer direta ou indiretamente particulares que tivessem interesses econômicos privados na atividade desenvolvida pelo Estado. Registrou que, de forma análoga, na área da saúde, o art. 199, § 2º, da CF vedaria a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. Por fim, observou que a imunidade tributária recíproca não deveria afetar intensamente o mercado ao trazer vantagens que pudessem desequilibrar a livre concorrência e a livre iniciativa. RE 580264/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 25.8.2010. (RE-580264)
 
Imunidade Tributária Recíproca: Sociedades de Economia Mista e Serviços de Saúde - 2
Em seguida, o Min. Joaquim Barbosa, tendo em conta esses aspectos, aduziu que, na espécie, a recorrente seria entidade hospitalar que prestaria serviços públicos primários, sem intuito lucrativo, e sob controle acionário praticamente integral de ente federado (99,99%, os quais decorrentes de desapropriação de 51% das ações da entidade seguida de aquisição do restante das ações do espólio do seu fundador). Frisou que, apesar de os argumentos serem todos favoráveis à pretensão da parte recorrente, no entanto, seria imperioso considerar o registro feito pela União no sentido de perceber a situação daquela como transitória. Ressaltou que a própria União, em memoriais, teria rejeitado a caracterização da parte recorrente como instrumentalidade estatal na área da saúde. Essa postura, para o relator, geraria certa perplexidade, haja vista que seria de se supor que a entidade detentora de grande parte ou da maioria esmagadora do capital social da recorrente pudesse, a tempo e modo, adequar a conduta da contribuinte que controla, para aquiescer à cobrança dos tributos, sem contestá-los administrativa ou judicialmente com base na imunidade tributária recíproca. Acrescentou que, para a União, as decisões que justificariam a peculiar situação da parte recorrente seriam efêmeras e que, a qualquer momento, ela poderia deixar de atender exclusivamente pelo SUS e passar a atender convênios. Destacou que, nesse ponto, seria relevante resgatar a responsabilidade que o ente federado teria na interpretação e aplicação da Constituição e da lei de modo que a previsível recondução da parte recorrente à competição no mercado deveria preponderar sobre o caráter transitório da situação vivenciada pela entidade hospitalar. Concluiu, diante disso, que o desprovimento do recurso seria mais coerente com o sistema constitucional do que a prolação de uma decisão condicional do tipo “enquanto perdurarem os seus requisitos”. RE 580264/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 25.8.2010. (RE-580264)
 
Imunidade Tributária Recíproca: Sociedades de Economia Mista e Serviços de Saúde - 3
Em divergência, o Min. Ayres Britto deu provimento ao recurso, sendo seguido pelos Ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso, Presidente. O Min. Ayres Britto, ao iniciar a fundamentação de seu voto a partir do art. 197 da CF, assentou que o serviço público em questão estaria franqueado à iniciativa privada sob a forma de assistência à saúde, não constituindo atividade econômica. Portanto, a iniciativa privada seria convocada para subsidiar o poder público, para se emparceirar com ele, na prestação de serviço público que, ao mesmo tempo, seria direito fundamental, e, pela ótica do art. 196 da CF, direito de todos e dever do Estado. Tendo isso em conta, e considerando a heterodoxia do caso — porquanto, desde a década de 70, o Estado, por desapropriação, seria detentor do controle dessa “empresa”, se assenhoreando da atividade, prestando-a ininterruptamente, e controlando 99,99% das ações, concluiu estar-se diante de hipótese que ensejaria a imunidade recíproca tributária. O Min. Gilmar Mendes também chamou atenção para a heterodoxia da situação. Na mesma linha se expressou o Min. Cezar Peluso que reiterou que a União teria expropriado praticamente a totalidade do capital social e, com isso, incorporado de fato ao seu patrimônio jurídico o hospital, conservando, por razões desconhecidas, 0,01% do capital social em nome de conselheiros antigos. Dessa forma, teria mantido a aparência de uma sociedade anônima que se submeteria, de regra, ao regime jurídico de empresa privada. Afirmou que isso, entretanto, não seria suficiente, pois se trataria, na verdade, de uma entidade pública por ser pública praticamente a totalidade do capital social, pública sua finalidade e pública, no sentido de potencialidade de exercício de poder, a direção do hospital, haja vista que a União poderia decidir o que quisesse, porque o 0,01% não significaria nada em termos de votação. Após, pediu vista dos autos o Min. Dias Toffoli. RE 580264/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 25.8.2010. (RE-580264)

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