segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Algumas notas sobre a tributação dos "importados" para uso pessoal

Transcrevo a seguinte notícia, extraída do portal Folha.com, relativamente à recente mudança nas regras sobre o ingresso de "produtos" importados (destinados ao consumo) para o Brasil, para ao final tecer algumas considerações importantes.

THAIS BILENKY,
DE BRASÍLIA
A partir desta segunda-feira, o viajante que comprar um telefone celular, um relógio de pulso ou uma máquina fotográfica no exterior não precisará mais declará-lo à Receita Federal ao retornar ao país. Esses objetos farão parte da cota de bens de uso pessoal, isentos de imposto.
A nova legislação, também isenta de tributação roupas e acessórios, adornos pessoais e produtos de higiene e beleza.
Baterias e acessórios em quantidades compatíveis, carrinhos de bebê e equipamentos de deslocamento como cadeiras de rodas, muletas e andadores também entram na lista.
Notebooks e filmadoras estão fora da lista de bens de uso pessoal. Devem ser declarados e entram na cota já existente, limitada a US$ 500 para quem usou transporte aéreo ou marítimo e a US$ 300 para quem utilizou transporte via terrestre, fluvial ou lacustre.
CIGARROS E BEBIDAS
A nova regra também coloca limites que antes dependiam da avaliação do fiscal da alfândega para serem fixados.
O viajante poderá adquirir no exterior e trazer consigo, no máximo, 12 litros de bebidas alcoólicas, dez maços de cigarros com 20 unidades cada um, 25 unidades de charutos ou cigarrilhas e 250 gramas de fumo.
Antes de embarcar, o viajante não precisará mais fazer a Declaração de Saída Temporária de produtos estrangeiros que está levando. Hoje essa medida é considerada pela Receita como excesso de burocracia.
O órgão colocará em seu site um "perguntão da bagagem", parecido com o "perguntão do Imposto de Renda", que define o que é considerado bem de uso pessoal e a quantidade permitida.
Pequenos presentes e suvenires que custem menos de US$ 10 poderão ser trazidos em no máximo 20 unidades, desde que não haja mais de dez idênticas.
FALTA DE CLAREZA
O Ministério da Fazenda e a Receita identificaram falta de clareza e transparência nas regras atuais.
Por elas, um fiscal poderia entender que duas garrafas de vinho são abusivas, enquanto outro poderia considerar uma caixa de uísque um consumo razoável.
Se o viajante comprar um iPod ou um iPad no exterior e comprovar que, durante a viagem, fez uso profissional da aquisição, não precisará declará-lo. Mas sempre precisará apresentar nota fiscal.
Caso uma brasileira chegue de viagem com um brinco de diamantes valendo US$ 50 mil nas orelhas, poderá ser questionada sobre a origem dos recursos para compra do produto, embora a joia faça parte dos bens considerados de uso pessoal.
 PS> penso não incidir imposto de importação algum no ingresso de produtos estrangeiros destinados ao consumo no  Brasil. Segue a justificativa, um pouco extensa, mas que merece ser lida pelos admiradores da disciplina tributária, a qual foi tema, inclusive, de um trabalho escrito defendido, por mim, em sala de aula na Unifor (enquanto aluno de uma pós):
 Preimeiramente convém destacar que a expressão “produto” - nos termos dos artigos 153, I, CF/88, e 19, CTN - representa toda coisa móvel corpórea e incorpórea (inclusive energia elétrica e softwares), sendo, assim, um fruto da natureza ou da atividade humana.
Todavia, não se pode desconsiderar que o Decreto-lei 37/66 (art. 1º.) que instituiu o tributo em estudo erigiu como fato gerador somente a mercadoria a qual pressupõe um bem destinado à mercancia (circulação mercantil) – acepção mais restrita do que a contida no texto constitucional e na norma geral / CTN. Estaria então - para parte da doutrina - configurado o não exercício pleno da competência tributária por parte da União, na medida em que o diploma instituidor (DL 37/66) não exauriu a amplitude da regra-matriz constitucional, reduzindo seu alcance prático somente às “mercadorias”.
Vejamos o que dispõe o artigo 1º do DL 37/66 em comento: “O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como fato gerador sua entrada no Território Nacional (...)”.
Saliente-se que tanto na redação original do Decreto-lei 37/66, como na redação acima (conferida pelo DL 2.472/88), ficou prevista a incidência sobre “mercadoria estrangeira”, não havendo previsão sobre “produto”, o que nos transmite a sensação de não ter havido equívoco por parte do legislador.
A redação literal do diploma retro mencionado deve ser analisada à luz do artigo 110 do CTN que nos informa que o legislador tributário não pode alterar os institutos próprios do direito privado (conceito de “mercadoria”, v.g.), bem como sua extensão e seus efeitos com vistas a ampliar a regra-matriz de incidência tributária previstas no texto das constituições federais, estaduais e nas leis orgânicas municipais.
E, sendo assim, o conceito jurídico de “mercadoria” não pode ser utilizado (elastecido) como sinônimo de “produto” sob pena de distorção semântica dos institutos do direito privado, haja vista que a mesma advém da teoria dos atos do comércio (direito privado, art. 4º / Código Comercial) referindo-se aqueles bens destinados à “mercancia”, comprar para vender – prática de comércio.
Portanto, uma interpretação contrario sensu desta norma geral em matéria tributária (art. 110/CTN) poderá nos conduzir para a idéia de que se a opção legislativa foi tributar menos (mercadoria em vez de produto) do que poderia fazê-lo – reduzindo assim a amplitude da base econômica - não estaria autorizado, o aplicador da norma infraconstitucional, a elastecer o significado das palavras, com vistas a cobrar tributo cuja abrangência da base econômica está prevista pela Constituição Federal de forma genérica (outorga de competência).
Ou seja, embora inegavelmente pudesse o legislador federal instituir imposto sobre a importação de qualquer produto, optou (inequivocamente) por tomar como fato gerador apenas a entrada de produtos destinados ao comércio (mercadorias).
Porém, não encontramos registros de pronunciamentos judiciais sobre aludida questão, ficando seu enfrentamento restrito à parte da doutrina tributária.
Outra observação a ser feita é que tendo em vista que o art. 19 do CTN, bem como o art. 150, I, da CF/88, se referem à “produto estrangeiro”, e não a produto proveniente do exterior, conclui-se que a reimportação de produto nacional anteriormente exportado não está sujeita ao imposto de importação. Neste sentido, o STF (RE 104.306-7/SP, mar/1986) declarou inconstitucional dispositivo do DL 37/66 que considerava “estrangeira”, para efeitos de incidência do II, mercadoria nacional reimportada.
Estrangeiro – produto que tem origem em outro país, nele tendo sido produzido pela natureza ou pela ação humana. Não compreende a base econômica do imposto em questão, portanto, o retorno ao Brasil de produto nacional ou nacionalizado exportado anteriormente. Neste sentido: RE 104.306/SP, Rel. Min. Octávio Gallotti, mar/1986, declarando a inconstitucionalidade do art. 93 do D.L. 37-66.
 Resta mencionar que o artigo 155, § 3º, CF/88, por sua vez, deixa claro que o imposto incide também sobre operações relativas à energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados do petróleo, combustíveis e minerais do país.
 Destaque-se que as isenções constantes no DL 37/56 (art. 13) referem-se às bagagens desde que constituídas de objetos de uso pessoal, doméstico, profissional ou científico, tais como: roupas e demais objetos de consumo ou uso necessários à estada do passageiro no exterior, objetos de qualquer natureza respeitado o limite estipulado por ato normativo do Ministro da Fazenda, bem como outros bens pertencentes às pessoas indicadas no inciso III do artigo retro mencionado.
 Além destes casos narrados acima de dispensas legais no pagamento do imposto em estudo, verifica-se que existe previsão no DL 37/66 para isenção, nos termos e condições estabelecidas no regulamento do II (isenção condicionada, portanto), de bens de interesse ao desenvolvimento econômico a exemplo dos bens de capital, bem destinados à construção, execução, exploração, conservação e ampliação dos serviços públicos, dentre outros referidos no diplomo retro.

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